domingo, 21 de abril de 2013

NOS BASTIDORES DA MENTIRA


Há várias modalidades de pessoas mentirosas. Mas a pior delas é aquela que acredita na mentira que está contando. Traiçoeira e dissimulada, nutre suas mentiras com tanta convicção que chega a mesclar sua realidade com o seu mundo de ficções, criando assim uma terceira via nos moldes de seus interesses mais obscuros.
Há que se ter muita cautela com pessoas assim, porque não é difícil que ela faça a sua imagem descansar aos cuidados do chão. Também não custa muito e pessoas de um determinado círculo passarão a lançar contra você um olhar aterrorizador, porque ao destilar a mentira o mentiroso acrescenta em seu tubo de ensaio o melhor de si e extrai em seu erlenmeyer o pior da vítima, criando assim um Frankenstein argumentativo nada salutar para quem sofre o processo.   
Imagens de outrora, gestos e hábitos ou até mesmo objetivos declarados, tudo entra na dança e serve ao mentiroso como matéria prima de suas alucinações, demonstrando que entre ele e as informações de que se utiliza há tão somente uma relação parasita.
Pouco importam os antigos laços, pouco importa a opinião alheia. Tudo deve servir ao propósito maior de exaltar a realidade que o mentiroso necessita fazer existir, porque se do contrário for, ele mesmo não existe e assim o seu mundo particular perde qualquer sentido. Daí a necessidade de expor a mentira, sua obra prima, para que todos a vejam, para que todos lancem seu aval tácito e assim coroarem o mentiroso com gestos de aprovação e moções de apoio.
Diante de um veneno tão bem inoculado, por vezes a vítima acaba por não saber o que fazer e comete o erro de tentar retrucar a mentira. Ledo engano...Mal sabe ela que assim a encrenca se amplia. Há certas situações que demandam tão somente o silêncio. Impassível, no primeiro tempo se mostra fraco e impotente, mas quando aplicado de forma determinada, revela-se a contraface que escancara as ânsias do mentiroso, fazendo-o se recolher, ao final, à insignificância de suas opiniões maquiadas. 

Rafael Guerreiro

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Muito Barulho


O Feliciano é realmente uma pessoa ímpar no cenário político. Carismático entre os seus, arrebanha multidões em enormes cultos evangélicos. Possui ótima oratória e um raciocínio rápido, elegante e lógico, conseguindo convencer milhares de pessoas. Ele maquia com maestria questões difíceis de serem digeridas por pessoas que não comungam de sua crença religiosa ou de seu posicionamento político.
As vezes fico a pensar como pessoas negras ou mestiças ou com orientação sexual diversa daquela por ele aceita ainda conseguem frequentar os cultos religiosos por ele liderados depois de declarações aberrantes proferidas em desfavor destas mesmas pessoas. O fato é que tudo reside no poder da oratória e na disposição alheia de desejar uma palavra capaz de salvá-la a qualquer custo de um mundo extremamente inóspito e causador de uma profunda sensação de estranhamento.
Curiosamente, Hitler conseguiu o mesmo na Alemanha Nazista. Da mesma forma, com seu discurso extremamente bem arquitetado, com profundo senso lógico e oratória impecável convenceu milhares de pessoas a compartilharem de uma ideia de mundo profundamente excludente e segregante. E muitas, mas muitas pessoas mesmo se sentiram amparadas dentro da esquizofrenia hitleriana.
Feliciano se diz amparado pela Bíblia, interpretada a seu bel-prazer, servindo às suas distorções particulares e inclinações sem muito pudor. Hitler, sem se dar conta de sua megalomania, mergulhava cegamente em sua eugenia iluminadora da humanidade.
O que vejo em comum entre esses dois personagens curiosos é que ambos se sentem verdadeiros portadores da verdade suprema que, na sua visão particular, se fosse aceita por toda a humanidade nos conduziria à iluminação e comunhão plena com o Sagrado.
E no meio de discursos inflamados, embebidos em lágrimas, suor e muita saliva que espuma pelos cantos de sua boca e também no microfone, Feliciano grita avidamente em favor de sua crença e contra a cor, dignidade ou, mais recentemente, contra o Deus de outras pessoas, trazendo no peito uma convicção tão contagiante que foi capaz de criar uma das maiores aberrações políticas de nosso tempo, o Deputado Feliciano, com mais de 200.000 votos e nenhum pensamento crítico.
Hitler tornou o mundo de sua época um pouco mais barulhento graças à sua artilharia disparada contra as diferenças alheias. Feliciano, por sua vez, torna, igualmente, o cenário político brasileiro um pouco mais barulhento com seus gritos e seu êxtase tão certos de si mesmo que nem se dá conta de como o mundo fica cada vez mais barulhento, cada vez mais barulhento, barulhento...

Rafael Guerreiro