quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Ao amigo Saimov

Caro amigo Saimov,
Suas indagações mais uma vez tornam-se extremamente positivas e bem-vindas.
Sobre quais os países optantes pela descriminalização, não posso lhe passar a lista completa, mas tenho de antemão que Portugal, Espanha, França, Bélgica e Itália já caminham sob essa nova forma de conceber a questão do aborto. Mas o rol por mim elencado não é exaustivo. Parte dessa informação pode ser encontrada de forma rápida e informal no site: http://www.acessepiaui.com.br/blog-do-oscar/paises-cat-licos-aprovam-a-descriminaliza-o-do-aborto/9205.html. Tenho certeza que uma pesquisa rápida no Google lhe trará boas informações complementares.
Em recente entrevista no jornal Folha de S. Paulo, o Frei Beto, religioso católico defensor da Teologia da Libertação, abordou a presente questão de forma muito lúcida e conseguiu, a meu ver, conciliar o discurso religioso com uma visão social e política verdadeiramente progressista. Segue o link da entrevista: http://www1.folha.uol.com.br/poder/819034-frei-betto-responsabiliza-igreja-por-ter-introduzido-virus-oportunista-na-campanha.shtml.
Sobre a questão de ser ou não o ato de abortar uma decisão que diz respeito apenas à mulher, necessito fazer algumas considerações.
Primeiramente, quando eu afirmei que a decisão cabe apenas à mulher, não excluí a perspectiva do ser humano indefeso que ainda habita as entranhas femininas. O que quis ressaltar é que a tomada de decisão leva em consideração, em sede primeira, o corpo feminino e não o do feto. Trata-se de um prisma que sempre terá em primeiro plano a visão do agente que pratica o ato.
Mas ouso discordar veementemente de você quanto ao argumento de o Estado promover a morte de indefesos ao legalizar o aborto.
Descriminalizar o aborto implica, como eu já mencionei no artigo anterior, em salvar um sem número de vidas, poupadas pela implantação de uma estrutura institucional mais capacitada a promover maior suporte médico, psicológico e social às mulheres que optaram pelo aborto.
Dessa forma, o Estado não promoveria a morte de indefesos, mas antes, agiria no sentido de contê-las ou até mesmo diminuí-las.
Devemos sempre ter em mente que o aborto ocorre e sempre ocorrerá, é um fato social que independe da posição adotada pelo Estado ou pela Igreja. O que devemos pensar é em como diminuir os casos existentes e salvar vidas!
Sobre a sua desconfiança marxista, acredito ser possível tranqüilizá-lo. É importante ressaltar que o aborto sempre foi e é uma ação extrema para uma mulher e que, acredito, afeta consideravelmente sua estrutura psicológica.
Não podemos tratar a questão como de fácil aceitação para o universo feminino. Não se trata de um ato simples e banal para quem aborta.
Tenho certeza que o Pedrinho poderia nos abrilhantar ainda mais sobre a questão trazendo a este caloroso debate a perspectiva da psicologia, principalmente sobre as representações simbólicas que o tema exerce sobre o universo feminino e os traumas decorrentes de uma ação como esta.
Por isso, acho um tanto kafkiano acreditar que a sociedade capitalista em que vivemos criará uma estrutura trabalhista capaz de impor a força dos detentores dos meios de produção contra mulheres indefesas obrigando-as a praticar o aborto.
Por fim, falando sobre seu último argumento, não vejo uma boa analogia entre a progressão continuada adotada na Holanda e a descriminalização do aborto que porventura fosse adotada aqui na Terra de Santa Cruz. Acredito que são experiências muito distintas. E também não ajuda muito acreditar que o Brasil não teria o suporte cultural e estrutural capaz de comportar as mudanças que o tema necessita.
Apenas para ilustrar, quando ocorreu a Reforma do Poder Judiciário, que se consolidou pela Emenda Constitucional nº 45/2004, o Brasil, com a reforma conseguiu implantar um órgão de controle administrativo do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça, que age como fiscalizador dos comandos institucionais adotados por todos os tribunais do Brasil. E de quebra, implantou junto um outro que controla o Ministério Público, o Conselho Nacional do Ministério Público, ambos tendo como membros juízes, promotores, advogados e pessoas comuns do povo, com notável saber jurídico. A França, escandalizada com a proeza brasileira, enviou uma delegação de juristas para tentar entender como os tupiniquins conseguiram implantar com tanta maestria um sistema tão inovador e eficaz como este, que para eles ainda estaria a anos-luz de ser alcançado.
Força Brasil!!!!!
                Abraços!

Rafinha Capa Blanca
19/01/2011

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