terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Sociedade furibunda, governança imunda, democracia moribunda.

Talvez a democracia, hoje, tenha se metamorfoseado em um conveniente ensejo para os interesses das classes de escol. Uma superfície eivada onde a nata se coaduna, onde as ganâncias convergem e os de cima gozam prazenteiramente sobre os de baixo. Uma oportunidade, um lócus a mais de investimento privado, dessa vez na coisa pública, com a própria coisa pública, em proveito privado.  Um recurso para as elites endinheiradas e privilegiadas se revezarem no poder com os políticos "carreiristas" mais aptos. Uma mescla de plutocracia com meritocracia, temperada por uma pitada de darwinismo social.
   Enquanto isso,  mostramos ao mundo nossa face tétrica, apavorada e apavorante. Mostramos o quanto somos estúpidos e violentos no trânsito, tornando-nos os campeões mundiais de mortes no tráfego... O quanto somos imoderados e intratáveis, a ponto de sermos os vencedores universais na mortandade por armas de fogo...  Mostramos  como somos egoístas e comodistas chegando em primeiríssimo lugar na desigualdade sócio-econômica entre as nações planetárias... Como estamos sempre prontos a abrir mão de nossos frágeis valores, fazendo da  nossa vida e de nossas exuberantes belezas naturais algo banal, e não "milagres” ocasionais da Natureza a serem usufruídos com encanto, reverência, alegria e respeito. 
   Tornamo-nos tão instáveis nas relações interpessoais que, em brevíssimo espaço de tempo, devemos nos tornar também os medalhistas olímpicos do divórcio e dos lares destroçados... Será por isso, ou apesar disso, que aceitamos passivamente dirigentes tão escandalosamente desonestos? Será que nossa grosseria generalizada nos embruteceu, nos tornando incapazes de agir ou reagir diante das mais acintosas e imorais práticas políticas, jurídicas e econômicas? Ou será porque, na verdade, há tempos entregamos “ao deus dará” a solução de nossas demandas civilizacionais, por meio de atitudes típicas do tipo “odeio política”, significando que a achamos complicada demais para fazermos de sua prática individual e habitual uma atividade hedonicamente compensadora? Parece que, contrariamente, a temos como uma ocupação enfadonha demais para tomarmos a nosso cargo a responsabilidade que nos cabe em uma república democrática. Responsabilidade de assumirmos o papel de censores e fiscais dos agentes políticos. Acreditamos mesmo no ignóbil axioma “cada um tem o governo que merece”?(Joseph de Maistre). Se a resposta for "sim", isso que implica na crença de que, da mesma forma que nossos políticos, não podemos mudar nossa natureza corruptível de um dia para outro! Sociedade dos absurdos! Afinal, é sofrível demais abandonar abruptamente um vício que nos corrói, não...? Afinal, é difícil demais extinguir os vícios de nosso sistema político, não...?(James Madison). 
   Quem sabe um belo e improvável dia, quando nossa sociedade, de onde saem nossos agentes políticos, tornar-se menos agressiva, egoísta e estúpida, teremos então governantes e governos dignos dessa nova sociedade, desse povo "marcado e feliz” (Zé Ramalho, Admirável gado Novo). Em suma, segundo o raciocínio de Joseph de Maistre, o ultra-contra-revolucionário francês, a governança que temos agora seria a que, por reflexo, ou por inépcia nossa, nos compete, ou pior, nos pertence e nos administra “por direito”.

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